sábado, 25 de abril de 2015

Apenas memórias (10)




               Cunha e Silva Filho


       Após  a minha  admissão ao Diretório de engenharia da  PUC,   um  mês depois talvez,  Arsênio contratou  os serviços de uma jovem senhora pra cuidar  especificamente da parte datilográfica dos ofícios,  circulares e outros  textos que movimentavam  a vida  naquele  pequeno  escritório. Não me lembro infelizmente  do nome dela. Só sei  ter sido ela uma   pessoa  amiga, afável,  prestativa, que me ajudou  muito  em dar conta  das tarefas  que nos eram   solicitadas a fazer em tempo  certo e por vezes urgente. Arsênio,  segundo  assinalei,  era  um presidente muito  exigente e não era  de brincar no serviço  da sua gestão.
      Quase sempre eu almoçava sozinho  no restaurante dos estudantes da PUC. Em seguida,  retornava ao batente no  Diretório no qual  cumpria  expediente de manhã até a tarde.
     Uma vez,  passei mal de saúde a ponto de a  senhoria  do  apartamento  onde eu  alugara duas vagas, uma para mim e a outra pro Winston, ficar com pena de mim e me indagar do meu estado de saúde. Era uma mal-estar, uma fraqueza que não havia  sentido antes. A senhoria, uma moça ainda bem jovem e bonita,  certamente  preocupada comigo,  me preparou  uma  gemada, que tomei  e, depois, fui deitar-me. O marido dela,  um senhor ainda jovem, alto, muito magro (dizia-se que era tuberculoso),  falando  sobre o meu  estado de saúde,  me aconselhou um outro lugar pra morar. Seria na casa  de uma  tia dele que morava   no bairro da Zona Norte, Vila Isabel. Ela, da mesma forma,  alugava  vagas pra jovens e adultos.
    Fui até lá conversar com a tia   dele,  uma senhora idosa, meio mulata, que me lembrava, pela indumentária,  uma cigana. Ela morava com uma filha,  uma moça muito  atraente. A casa era grande e velha. Para lá fui com o meu   irmão Winston.
    Continuava indo pra PUC a fim de atender ao presidente do Diretório. O meu  amigo  Joaquim  Baptista, de quem falei atrás, sempre   andava bem animado e solícito na seção de  reprografia. Foi quase um pai  pra mim.
   Aquele mal-estar, que sentira antes, já dava outros sinais. Sentia-me mal, um pouco inchado, pálido e fraco. Comecei a  ter nojo de  uma comida  servida por um senhora  que trabalhava  na PUC  em serviço  humilde.   Era a esposa de um dos  vigias, que morava numa casinha  dentro do campus,  bem perto  daquele conjunto de casas, uma das quais a do Diretório.  Quando  ia  almoçar lá, sentia  nojo da comida: resultado provável dos sintomas da doença. A outra alternativa seria o restaurante dos estudantes, onde a comida  era  melhor, porém mais  cara e o dinheiro era curto.
   Estava na  PUC uns  quatro meses, se tanto. A doença  piorava. Sentia vontade de comer  algo  inusitado:  vontade  de comer barro, aproveitando-me de paredes com alguma pequena abertura  de pintura descascada  exibindo  o barro do tijolo. Fazia  isso  várias vezes contra a minha vontade  e as razões da lógica. Era um impulso  irrefreável.
   Não estava realmente bem, precisava  de ajuda, de serviços médicos. Foi quando relatei  esta situação ao meu      irmão  e lhe pedi que falasse com  o Olavo. Já mal  aguentava   trabalhar. Passei a faltar ao  trabalho.
     O deputado  Sousa  Santos tinha sido  informado do meu estado de saúde através  do seu  secretário, e bem assim meus pais. O Olavo falara com meu irmão que me iam  arranjar uma internação no Hospital  Pedro Ernesto, na Rua   28 de  Setembro,  Vila Isabel,  pertinho  da vaga em que  morava.
    Fui com o Winston ao Hospital Pedro Ernesto. Nos dirigimos pro Centro de Hematologia, onde seria  recebido   pelo  Diretor,  o Dr. Hildebrando Monteiro Marinho,  um  médico renomado, que me recebeu  bem, me examinou cuidadosamente e concluiu logo pela minha i mediata internação pra tratamento de anemia.
   Dr. Hildebrando  tinha um  defeito físico, se não me engano,  numa das  pernas,  pois andava descompensado, certamente  por ter uma das pernas  menor do que a outra. Era um  médico notável consoante, com   o passar dos dias em que estive internado, quase uns dois meses,  constatei. Em dias  marcados,  inspecionava  criteriosamente todas  as duas   enfermarias (uma pra crianças e mulheres, outra pra adultos  de  pacientes  com  anemia e sobretudo com  leucemia.
    Levei pro hospital os meus pertences: uma mala com roupas, o meu  único terno, algumas camisas, cuecas, aparelho de barbear, escova de cabelo, escova de dente, pasta de dente, sabonete,  alguns livros e meus documentos. 
   Na enfermaria, iria  encontrar  pessoas inesquecíveis, como  o médico que cuidou de mim, o Dr. Sérgio  Franco, jovem  médico,  alto,  forte, de boa aparência,  simpático,  afetuoso, desses médicos que hoje    estão rareando."Oi, Francisco,como se sente?" Dizia isso pegando a minha mão e examinando-lhe a palma. "Ainda está pálida. Tem que ficar como a minha: coradinha," arrematava o hematologista.
  Outra pessoa  que não posso  jamais  esquecer era um das enfermeiras, que tinha  plantão à noite. Exemplar  profissional da enfermagem.  Atenciosa,   meiga,  bonita, fiquei encantado com ela. Até fizemos  amizade depois de algum   tempo de internação.
    A minha  enfermaria ficava na parte central do segundo  andar do hospital, a qual dava pra  Rua  28 de Setembro, com a sua dupla pista   para os veículos em constante movimento de ir e vir. Da sacada ampla, via o movimento  das pessoas  e dos carros.Na enfermaria  havia sempre   doentes em seus leitos esperando  pela cura de seus males. 
   Numa enfermaria  contígua,  havia crianças,  muitas delas  com leucemia e muitas delas vi  morrer  diante dos olhos dos médicos  e das enfermeiras. Eram cenas  tristes  e mesmo  trágicas. Nunca  me esqueci de  uma linda menina de uns doze anos,  alourada,  clarinha,  que vi morrer. Seu corpinho frágil,  imóvel, muito pálido,  foi retirado  por funcionários e encaminhado para outro setor do hospital. Pobres crianças mortas na flor  dos anos da infância ou  princípio da adolescência!
        Havia também a alegria de pacientes que lá se internaram e vieram pra minha enfermaria. Um senhor  cinquentão muito conversador,  amulatado,  que usava óculos e  era meio  calvo com quem passava horas falando da situação política do país, no início de uma ditadura militar que seria longa. Passou a fazer parte dos meus  conhecidos  de enfermaria. Havia outro paciente com aparência de  nordestino Estava  bem  doente e  veio a falecer alguns dias depois que me internaram. Não suportou a leucemia.
      Nos dias de visitas,  pessoas das famílias dos doentes vinham visitá-los. Eu não tinha ninguém  que me viesse visitar. Ficava  sozinho, deitado no meu leito, perto da seção  da enfermaria. Meu irmão Winston, de  duas em duas semanas,  vinha me ver e aproveitava  pra  almoçar. Isso  se fazia às escondidas, já que o hospital só fornecia  refeições aos doentes.
        Por falar em visitas durante a minha permanência no hospital no Pedro Ernesto, um há que diz de perto do comportamento dos órgãos públicos, o qual, de ordinário, vive da aparência e não da realidade.
        Um dia, vieram me visitar o deputado federal Mauel de Sousa Santos acompanhado do fiel escudeiro, digo,   secretário, o Olavo.A direção do hospital pôs-se em povorosa e o fato era bem mais visível na minha enfermaria. "Chegou um deputado federal pra visitá-lo, Francisco" -  atalhou uma das enfermeiras. De repente, aparece, com movimentos apressados,  o pessoal  da arrumação, varrendo, espanando, lustrando o largo  espaço da minha enfermaria, trocando lençóis, colchas,  travesseiros,  fronhas, roupa limpa pros pacientes. Isso tudo,  claro,   para aparecer que aquele lugar era perfeito, asseado, com tudo em seus  devidos lugares, funcionado às mil maravilhas.
    O deputado e o secretário entraram finalmente na  enfermaria. Foi o Olavo  que logo me viu sentado  no  meu leito. O parlamentar era um senhor ainda  novo, de boa altura,  vestido com  esmero no seu terno de tecido fino; Olavo, da mesma forma,  usava um terno elegante. Conversaram   comigo durante alguns minutos sobre o meu  estado de saúde e me indagaram se o tratamento era de qualidade. Lhe respondi afirmativamente. "Estou sendo bem tratado, me recuperando a olhos vistos. Meu médico,  o Dr, Sérgio Franco é muito bom,  as enfermeiras, também.  Os dois saíram acompanhados de dois senhores que chegaram depois, provavelmente pertencentes à direção  do hospital.
     Poucos dias  depois da minha internação,  recebi uma visita alvissareira: a da minha colega de trabalho do Diretório Acadêmico de  engenharia da PUC. Sua missão  fora  me entregar  uma quantia em dinheiro como indenização   que o presidente do Diretório   resolvera enviar pra mim. Era uma boa quantia, que me deixou  bem alegre,  porquanto dela  iria  precisar  pra pagar uma vaga  onde fosse  morar quando tivesse alta  hospitalar.
      Ainda por falar de visitas de conhecidos ou parentes, as quais, o leitor pôde ver que foram quase nulas, um belo dia (vou-me permitir o lugar comum) apareceram, de repente,  na minha  enfermaria o meu tio Carlitos e um tio-avô materno, o major  Dico, militar do  Exército e, se não me equivoco,  fora  professor de educação física. Fiquei contente com a presença deles. Vieram saber como estava. Entretanto, não quero pensar mal  deles, contudo ele tinham  um  viagem à Teresina, não sei se os dois juntos. Naturalmente,  pra não ficarem  mal com a minha família,  se deram ao trabalho  de me fazer uma  vista. Assim,  quando , em Teresina,  meus pais falassem  - o que lhes seria mais do que  obrigatório -  sobre a minha   internação,  eles teriam  assunto e tudo  estaria perfeitamente nos seus   lugares certos. 
      Ainda não lhe contei , leitor, qual foi a causa da minha doença: uma anemia provocada por um parasito chamado "necator americanus," que se introduz na sola dos pés das pessoas quando descalças.É comum no Nordeste.Alguns parentes pensaram erradamente que sofria de leucemia.Ela não se manifestou em Teresina, porém veio me acometer em terra carioca.
    Meu irmão Winston, que  tinha uma vaga  na  velha casa   da senhora idosa  de Vila Isabel, como não  tinha  arranjado  nenhum emprego,  pediu a ela que   ficasse morando  numa canto da  casa e, como  pagamento,  a ajudaria  em alguma coisa. Assim  foi combinado. Entretanto,  não demorou  muito  e a senhora idosa  pediu que  deixasse a casa. Winston, então,  ficou no olho da rua, sem  saber onde se alojar. 
   Começou uma  peregrinação  na rua,  dormiu até em banco de trem da Central do Brasil. Os parentes não se ofereceram para lhe dar abrigo. Sofreu muito,  inclusive  com  o risco de ser  vítima de algum  bandido  pelas ruas  do  Rio de Janeiro à noite e nas madrugadas. Fosse atualmente, seria perigoso por causa da escalada de violência no paí, sobretudo nas grandes urbes como São  Paulo e Rio de Janeiro.
    Suas idas ao  hospital,  mesmo  em dias  que não  eram   de visita,  se tornaram  recorrentes.. Ele, malandramente,  conseguia  entrar no hospital  e  vinha até a  mim, almoçava às  ocultas  e me pedia dinheiro. Lhe disse que  não mais lhe podia ajudar financeiramente. O dinheiro da indenização  estava  minguando.  Que ele tratasse de voltar   pro Piauí, já que com parentes  não podia contar
    Um primo meu, sabendo que  recebera uma indenização,  me veio  pedir  empréstimo.  Eu o atendi. Ora,    pensei comigo: até doente no hospital  alguém me aparece pra  pedir  dinheiro  emprestado. Pra me visitar como  parente,  não vinham. Era demais. 
      Continuava internado, sendo medicado a tempo e hora No almoço, comia com frequênca, fígado, feijão, arroz e salada de legumes. As palmas de minha mãos já estavam bem mais coradas. Dr. Sérgio vibrava. Amanhã, lhe vou mandar aplicar uma espécie de purgativo, muito forte.Ele deixará você um pouco tonto após evacuar. Mas isso é normal. Seu tratamento está chegando ao fim. O Dr, Hildebrando dará a última palavra e com certeza terá alta.Exultei de contentamento.
    Na manhã seguinte, após fazer a higiene  no banheiro, saí meio tonto.Incontineti, fui me deitar.  Veio, uma hora depois, aquela doce enfermeira.Conversou comigo e me perguntou se estava melhor. Lhe respondi que estava ainda tonto. Ela, então, foi até sua sala, uma espécie de laboratório, e de lá me trouxe um medicamento que me ajudaria a diminuir a tonteira. Me falou ainda que, dali a uma hora, chegaria o Dr. Sérgio Franco que, com de costume, examinava cada paciente dele.
     Com efeito,  uma hora depois, vem o Dr. Franco com olhar simpático e acolhedor. Chegando a minha vez, me perguntou: "Então, Francisco, como se sente agora?" Me pediu que mostrasse as palmas das mãos. "Ah, agora, vejo que estão coradas. O Dr Hildebrando falou-me ontem do seu caso e me me disse que, em quatro   dias, estaria de alta". Todos os cuidados foram tomados, medicação, aplicação de vermífugo. "Você reagiu bem ao tratamento," finalizou ele.
    Antes de deixar o hospital, num domingo, pedi  a um rapaz, que cuidava da limpeza da enfermaria, que me comprasse  um  exemplar do Jornal do Brasil e, por acaso, dei uma olhada nos classificados, seção de empregos. Um anúncio da Embaixada  Americana estava recrutando jovens com, no mínimo, o colegial completo e que tivessem alguma fluência do .inglês. O anúncio exigia agilidade em datilografia. Este último pré-requisito me preocupou, de vez que tinha aprendido  muito pouco datilografia num curso que fiz na Praça  Tiradentes, Escola Edson, no Centro  do Rio. Não consegui concluí-lo. Me faltou dinheiro pras mensalidades  Esqueci esse detalhe. 
   A vontade de obter uma colocação falou mais alto.Pedi  ao Dr. Franco que me permitisse sair do hospital a fim de comparecer à Embaixada   Tirei o terno da minha mala,  uma camisa  clara de mangas compridas,  a gravata com o mesmo nó, lustrei os sapatos e tomei a rua.  Peguei um ônibus que me deixou na Cinelândia. De lá fui caminhando   pra Avenida Presidente Wilson, onde se localizava a Embaixada Americana (hoje Consulado). O  edifício, uma construção moderna, cheia de vidros, é o mesmo de hoje e ainda está bem cuidado, apenas com modificações na calçada em frente para efeitos de segurança.
   Me identifiquei na entrada informando o motivo de estar naquele lugar. Havia homens muito altos fardados. Eram militares americanos que prestavam serviço à Embaixada. Subi no elevador que me levou ao andar  e sala indicados no  anúncio. Entrei numa pequena ante-sala onde uma funcionária me atendei. Ela me pediu que aguardasse um pouco, apontando-me  para um sofá. Havia duas mulheres não muito jovens que conversavam em inglês. Estavam alegres e, de vez em quando, davam  algumas risadinhas inadequadas ao ambiente.
     Fui testado no inglês por uma senhora americana muito séria e objetiva. Segundo ela, passara no exame de conversação. Veio a prova de datilografia  Me entregou uma máquina meio velha e solicitou  a que datilografasse um texto - ainda me lembro - uma carta pedindo emprego justamente à Embaixada. 
   Ao preparar-me pra bater o texto que devia ser executado em breves minutos, talvez uns dez minutos, fui logo sentindo que aquela máquina era diferente das que usara pra treinar no curso da Praça Tiradentes. Em suma. com muito custo, consegui copiar a metade do  texto.A senhora americana foi curta mas não grossa: "Francisco, você não  tem domínio em datilografia. Podemos dar por concluído o teste. Boa sorte. Saí de lá quase  chorando. Sempre a datilografia a perturbar a minha vida!
     De volta ao hospital, a  enfermeira  atenciosa - que pena não me lembrar do nome dela - me perguntou sobre o resultado do emprego. Não lhe contei a verdade.  Ainda bem que faltavam dois dias pra deixar o hospital. Apenas  lhe adiantei que o resultado sairia dali a uma semana.
   Ao deixar o hospital, me despedi de todos.  O  rapaz da limpeza se prontificou a levar a minha mala até à casa na Rua Jorge Rudge, Vila Isabel,  na qual continuei na minha vaga.
  Meu irmão Winston, continuava na rua. Foi, então,  que decidiu voltar pra Teresina. Me recordo de que  fizera a viagem numa kombi conseguida pelo  Olavo. Por incrível que pareça, Winston  estava, no dia da partida, na   casa do tio Zequinha com quem eu  estava de relações cortadas. Por isso,  fiquei aguardando na esquina da Travessa Santa Luzia,em Oswaldo Cruz.
Após colocar a mala num banco da kombi,  meu irmão  me deu um forte abraço. Nem vi direito a cara do motorista.  Acompanhei  o movimento do veículo  até dobrar uma outra esquina.Sentia já saudades dele e ao mesmo tempo  senti solidão.Por outro lado,   regressar à casa paterna seria melhor pra ele. Até hoje,  vislumbro a cena da kombi correndo, em velocidade média, até se perder de minha vista.
  A bela enfermeira me deu, numa pequena folha, o seu endereço. Era em Copacabana. Anotei, depois, numa página final de um Dicionário de gramática, de Walmírio Macedo, na edição antiga publicada pela Edições de Ouro. Mantive comigo durante anos aquele prestimoso e útil dicionário, que consultava amiúde.
  Anos depois, já professor do Colégio Militar do Rio de Janeiro, dei de presente a uma colega, professora de inglês, aquele pequeno dicionário. A professora tinha sido aluna de língua portuguesa do autor, grande filólogo e, vendo eu o quanto a professora admirava o ex-professor Walmírio, terminei por lhe passar às mãos aquela obra. A anotação do endereço daquela formosa  enfermeira se apagara com o tempo. Uma pena!

    Meu pai tinha uma filha  da primeira  mulher  com quem  se
 casou em 1927, no  Rio de Janeiro. Ao chegar ao  Rioa., me foi  apresentada pelo primo Wellington que, um dia, me levou  à casa dela. O Wellington era aquele mesmo  que  me  ajudou na minha chegada  ao  Aeroporto Santos Dumont. Nélia era seu nome. Morava com a mãe no Centro  do Rio, na Rua  do Senado. Mercedes era  o nome  dessa primeira mulher de meu pai.
  Nélia era uma moça ainda jovem, alourada,  de tez  clara, muito espirituosa, brincalhona, nem feia, nem bonita..  Trabalhava, então,  no Laboratório  Silva Araújo Centro, na Avenida Beira-Mar, Centro. Estava noiva de um  diretor  de firma, que vim a conhecer. Estive na festa elegante  do seu casamento, realizada num  apartamento em Botafogo. Ate´ me fotografaram. A foto, anos depois,  me foi  mostrada pela minha  meia irmã.Eu estava ainda com os meus dezoito anos, em plena  mocidade.
  O esposo de Nélia,  meu cunhado, era um moço  de ótima aparência,  educado,  muito claro, de estatura média,  sempre envergando  um  terno elegante, talvez fosse até mais novo do que a minha meia irmã carioca.
  Na festa,  estava com os meus primos,  o Wellington, que sempre foi amigo de Nélia e o seu irmão, Weyden, Este, no breve  tempo em que morei  com  o  tio Zequinha,  viera também  pro Rio a fim de  trabalhar  e talvez estudar  Sobre  ele ainda me  reportarei nestas remembranças.
   Após o casamento, Nélia foi morar em Vila Isabel, num apartamento  pequeno, mas bem  confortável  Pouco tempo depois de casada, me convidou a passar uns dias com ela. Fui  com prazer e fizemos alguma amizade. Agora,  me recordo,  seu esposo tinha por nome Ernani. Não sei se ainda está vivo. Não o vejo há muito tempo. 
     Esta meia irmã faleceu  tempos atrás e em circunstância trágicas, segundo me informaram: ela havia sido vítima de um enfermeiro psicopata que, num hospital do Méier, andava matando pacientes dando-lhes medicamentos mortais. Nessa época, minha meia irmã beirava  os sessenta anos.   Deixara  dois filhos, um rapaz uma moça.. Tivera três. O primogênito, contudo,  faleceu bem jovem, chamava-se  também Ernani, nome do pai. Eu o vi no seu primeiro dia  de nascimento, numa clínica na Rua  Riachuelo, Centro da cidade. Tornou-se um jovem de ótima aparência. Era  meio gordinho, baixo e muito  educado. Antes de falecer,  trabalhava num  Banco. Acho que o SAFRA, no Centro da cidade.


   A última vez que tive contato com ela foi em 1985,  quando meu pai e minha mãe  passaram   uns dias  comigo no Rio, tempo em eu que residia num apartamento da Vila da Penha, subúrbio da Leopoldina.  A viagem  de papai ao Rio fora um despedida. Seria a última de sua vida. Mamãe faleceria poucos anos depois. 
  Meu pai,  minha mãe, minha esposa e eu fomos de carro, minha esposa dirigindo,  à nova  residência de Nélia, no bairro  de Lins, Zona  Norte carioca.    A boa imagem que levei dela datava dos dias em que com ela convivi em Vila Isabel e a lembrança mais grata foi esta: um dia,  chegando de algum  lugar,  a encontrei  passando a  minha roupa com  cuidados de uma boa irmã. Senti vontade de chorar com  aquela cena  comovente. (Continua)

Nenhum comentário:

Postar um comentário