segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Viagens: um aprendizado (1)








                                      Cunha e Silva Filho


            Escritor, jornalista, poeta,  ensaísta,  conferencista,  crítico literário e professor  universitário  brasileiro, nascido em Santos,  São Paulo, autor de várias obras, Cassiano Nunes (1921-2007)  diz num de seus livros, A sedução da Europa (1958), livrinho lido há muitos anos e que me deixou  forte  impressão  de suas anotações  de viagens, que  o mais importante não  é o  viajar em si, mas  ter personalidade,  segundo ele,   o abacadraba, a “palavra mágica”, vocábulo que vem  do grego e chega a nós através do latim. Palavra  cabalística,  liga-se  semanticamente a superstições e a outras coisas mais.
Cassiano  me parece dizer com isso que  não é preciso  viajar  para   ser o senhor do conhecimento, e sim  mostrar  qualidades do caráter,  experiência adquirida  por  tantos outros  modos,  por exemplo os livros.                       Machado de Assis que o diga,  nunca foi ao exterior e ele o podia  fazê-lo, mas era dotado  de um  enorme  saber literário, uma grande capacidade  de imaginação  e, pelos livros,  pelo jornal,  pelo estudos de  idiomas  estrangeiros,  como  o francês, o inglês, o italiano,  o espanhol e até  algum conhecimento  do alemão, que aprendia  sozinho,  com  anotações pacientes,  se tornou  o  mais  importante  escritor  brasileiro de todos os tempos..Fala-se  que era bilíngue e me parece que era em relação ao francês, que  escrevia com desenvoltura.   Seu  contato com  figuras  ilustres  do Segundo Império e da República  Velha, como  Joaquim Nabuco,   Rui Barbosa e outros nomes  ilustres da intelectualidade  brasileira da época, só lhe dilataram  os horizontes culturais.
Deixemos, contudo, o grande Machado e esqueçamos  também  o que  nos  disse Cassiano Nunes, professor durante vários anos na Universidade  de Brasília até se aposentar.  De Cassiano se afirma ter sido um dos intelectuais  brasileiros que mais  conferências  pronunciou no  exterior, inclusive  fez  conferência em Teresina, Piauí,   na Academia Piauiense de Letras. Era um  escritor   encantador,  um ensaísta de mão cheia, um pouco  esquecido  nos tempos  atuais infelizmente.
 Dono de um estilo  límpido,  claro,   e profundo nos  assuntos  de suas  áreas,  literaturas  brasileira,  portuguesa, norte- americana, alemã. Fizera  curso de literatura alemã   na célebre Universidade de  Heidelberg e de literatura  norte-americana na Miami University. Deu  aulas e fez palestras  de literatura brasileira  em universidades nos Estados Unidos,  Cuba, Cabo-Verde, Equador. Lecionou ainda como  Visiting Professor, na  New York  University. Cassiano   ainda se dedicou, mais tarde, também  ao gênero  poético, com  muitos poemas traduzidos  para outras línguas,  especialmente o  inglês,  e, como  poeta,  com  obra  considerável mas pouco  conhecida do grande público, é de alto valor. O país  logo esquece seus filhos  ilustres.
Há pouco fiz  uma viagem de carro com  a minha esposa a convite de uma  amiga,  a Harley que, com a coragem  que a caracteriza e o domínio  que tem  do volante, nos  levou  em seus potente carro do Rio de Janeiro a Curitiba, onde encontraríamos  meu filho,  esposa e minha netas. A parte principal  da viagem  tinha um destino  prioritário,  Foz do Iguaçu, e atravessar as fronteiras da Argentina e do Paraguai.
 Meu filho Francisco Neto e a esposa, Marisa iam   no seu carro  à frente, indicando à Harley o percurso  correto. As minhas netas,  Isabella e Amanda,  muito amigas  da Harley, se juntaram no banco de trás com  a minha esposa. Isabella  é afilhada  de Harley. As três se dão tão bem que parecem  irmãs.
On the Road! Lá íamos  pelos estradas paranaenses, vendo  paisagens deslumbrantes, estradas que pareciam  perder-se no horizonte. Dentro do confortável carro,  as brincadeiras da  netinhas, os deliciosos  lanches  servidos,   os refrigerantes, tudo preparado e arrumado previamente por Harley e colocado no carro. “Voyager! Quel  plaisir! Quel  privilège! Estas frases  me vinham  imprevistamente  à memória, frases que  foram  lidas  e  decoradas  com carinho do livro  de Marcel Debrot, velho autor didático do final da segunda metade dos anos 1950.
O bom da viagem é mesmo  o companheirismo  dos amigos. A conversas mais variadas, ora mais  sérias, mais culturais, ora  mais amenas, mais  cheias de humor. E, assim,  vencíamos  os quilômetros, Às vezes,  Harley, quando  sentia  necessidade,   "turbinava"  seu carro  para   não perder  tempo  atrás de um  carro-tartaruga. Chegamos, afinal,  em Curitiba, sempre com aquele  ar acolhedor, com aquele verde se impondo na cidade moderna e de ruas largas. Fomos para a residência de meu filho, não sem antes encontrarmos  alguma dificuldade para acertar o caminho  para o  bairro em que mora. Depois de ligações telefônicas para ele e da sua orientação,  acertamos  o  caminho, é claro, só depois que ele veio  de carro  se encontrar conosco. Os dois carros  seguiram,   o dele na frente,  o da Harley atrás seguindo-lhe os passo.
Descansamos  a tarde toda na casa de meu filho. Dormimos e, no dia seguinte,  deveríamos pegar a estrada e seguir para Laranjeiras do Sul.
Laranjeiras do Sul,  a primeira parada  mais significativa. Harley, Elza, minha esposa e eu ficamos  num  hotel que não era  o do nossos sonhos, mas muito ao contrário. Meu filho e a família foram  pra casa de um amigo e combinamos  de nos encontrarmos  à noite para um jantar
O recepcionista do hotel  em que pernoitamos  era muito inconveniente e dava-se à liberdade de falar o que queria, no que foi  repreendido  por mim na  hora exata. Mudou  o comportamento  brincalhão  e começou a me tratar  com  respeito. No dia seguinte,  deixamos o hotel não sem  um comentário  justo de Harley sobre o  incidente no quarto que  ocupara para pernoitar: havia visto  lá uma ou duas baratas. Isso deixou a recepcionista sem graça ao perguntar esta  como  tinha sido  o descanso da noite. O fato é  que o hotel  era muito modesto e coisas  essenciais como frigobar,  ventilador não  funcionavam. Ali nos quartos  só estavam pra constar.  O café foi  "o café": ruim demais. Mas o preço  da diária fazia jus ao que oferecia  o  hotel  perto rodoviária.
De noite, conforme combinamos,  jantamos na mesma cidade com  um casal de amigos de  meu filho.O problema era que a carne era boa mas tinha sal demais  para a minha hipertensão.(Continua)



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