sexta-feira, 23 de março de 2012

Universidades, concursos públicos e zonas de sombra



Cunha e Silva Filho


É aspiração voluntária, desejada e necessária que professores estudiosos, competentes e com projetos de contribuir para o desenvolvimento do saber ingressem no ensino superior público ou no setor de relevo privado. Nada mais do que justo tudo isso.
Na prática, porém, para ingresso à universidade, o candidato a docente enfrenta atualmente no país um série de percalços: quase que rotineiramente, a universidade - vamos ficar com o exemplo das públicas -, federais ou estaduais, só oferece uma única vaga a ser disputada em certames para os quais se inscrevem um bom número de pretendentes, todos presumidamente competentes, com experiência docente e com currículos vitae variados em níveis de produção científica. De qualquer modo, supõe-se que os postulantes à vaga única desejem , cada um , preencher a vaga oferecida. Aí que as dificuldades começam a surgir principalmente na sequência de etapas a serem atravessadas pelos candidatos: a prova escrita , a leitura da prova escrita, que é assistida por todos os candidatos, caso o queiram, a prova didática (ou de aula) , a prova de títulos.
Na prova escrita, durante a fase de leitura pública, cada competidor vai avaliando em que medida ficou acima ou abaixo do nível de seus concorrentes, levando-se em consideração que o candidato seja dotado de um espírito isento de subjetividades e narcisismos impeditivos de avaliar o colega de forma independente e imparcialmente, o que é , reconheço, algo difícil no período dos exames. Da parte da banca, vai depender também de que ela se revista de alto discernimento, de isenção, que, se não foram considerados, podem descambar para um julgamento injusto ou por um julgamento que se fixe apenas nas falsas impressões de um cultura de citações dos candidatos que, no conjunto da aferição da banca, resulte parcial e flagrantemente injusta. Essa etapa da prova escrita e, depois, lida pelo candidato, não deixa de ser influenciada pelo subjetivismo dos examinadores de acordo com o tipo de orientação teórica e linha de abordagem de cada um.
Na etapa da prova didática, ou de aula, os mesmos componentes de subjetividade podem prejudicar o candidato, já que uma aula “artificial” – e não há como rotulá-la diferentemente - que será ministrada pelo candidato jamais será o verdadeiro espelho daquela que o candidato daria em condições normais de docência em sala de aula e enfrentando a normalidade da rotina de um professor tarimbado e que disponha de toda uma vasta experiência em lidar com a realidade do discente sem os constrangimentos daquela “aula artificial”, cujo maior objetivo deveria ser - e não o é muitas vezes - o de detectar possíveis falhas dos candidatos, desde, por exemplo, a sua postura, a sua técnica de desenvolver a aula acompanhada de possíveis instrumentos didáticos, realia, a sua voz, o seu domínio do tema abordado e o seu jogo de cintura que não passa de uma demonstração da sua personalidade intelectual e do nível e alcance de sua competência e vivência com a matéria, não deixando de fora fatores como vocação para o magistério superior, o prazer de lecionar, o entusiasmo inato para a função e senso de alta responsabilidade diante do grupo de discentes sob a sua orientação e responsabilidade.
Nessa fase do concurso, poderão surgir outros componentes da parte da banca que, se não forem conduzidos com grande critério de objetividade e visão geral da figura do concorrente e até de deduções lógicas, dificilmente poderão encontrar no candidato ocultas virtualidades que dele fariam um excelente profissional digno de ingresso a uma universidade, e até servindo mesmo como fato determinante para elevar o nível do corpo docente da instituição de ensino superior.
O complexo cipoal do corpus do editais para concursos falha muitas vezes no que diz respeito à avaliação da média dos candidatos. Por exemplo, considerar para tirar a média geral do candidato e classificação final, a condição da aprovação, que tem caráter eliminatório, da prova didática. Ora, isso não passa de um condição injusta e ilógica, porque abre a possibilidade de aprovação de candidatos que tenham títulos abaixo da insuficiência necessária à aprovação das notas todas.
Por outro lado, há ainda uma parte do concurso que se sobrepõe ao conhecimento do candidato. O candidato não saberá nunca como se processo o resultado final dando a vaga àquele candidato que obteve , na media final, a melhor nota. Nesta zona de sombra é que podemos aventar possibilidades do que se poderia denominar “ajuda oculta”, favorecimento a um candidato, manipulação de notas de candidatos, para que não pudessem concorrer, na etapa final da prova de títulos. Sei, por experiência, de caso em que já se sabia a quem iria a banca conceder o prime iro lugar num concurso do tipo que estou comentando. Por exemplo, indicação de candidato sem experiência docente nenhuma e, portanto, sem lastro de títulos e de formação de currículo praticamente nula, vencendo um concorrido concurso de uma universidade para a qual candidatos de alto valor intelectual e de grande experiência docente além de um boa produção científica.
Estas zonas de sombras constituem um dos mais calamitosos e vexatórios, para não dizer injustos, exemplos da educação superior brasileira, cujos pontos mais execráveis são as demonstrações do espírito moralmente desvirtuado de formação de feudos, igrejinhas e conchavos predeterminados que somente aviltam e desprestigiam o conceito sadio que deveria continuamente nortear as práticas docentes e administrativas da universidade brasileira, com as exceções de sempre que não podemos nem devemos subestimar.

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