quarta-feira, 5 de maio de 2010

Quem tem medo de ser político?

Quem tem medo de ser político?

Cunha e Silva Filho


Neste ano de campanha política para a eleição de presidente da República, de governadores e parte de senadores, fico a me perguntar se a política é mesmo vocação ou só vontade de possuir poder e receber os salários melhores do mundo como costuma dizer Villas-Bôas Corrêa, veterano e brilhante jornalista do Jornal do Brasil. Sem sombra de dúvida, as duas coisas Só que, entre uma e outra, paira no ar uma miríade de contradições e ambiguidades.
Costuma-se falar mal dos políticos de carreira, aqueles que, uma vez ingressando nesta seara, não mais querem dela se afastar. Ao contrário, nelas amadurecem, envelhecem e morrem. Deles há que, depois de um ou dois mandatos, desistem das mordomias por um ou outro motivo de foro íntimo ou porque, tendo pleiteado mais um mandato, não se reelegeu e, então saem de campo.
Quanto aos candidatos jovens, é corrente a opinião de eleitores que declaram publicamente, ou só a boca pequena, serem aqueles os mais indicados para moralizarem as câmaras municipais, as assembleias estaduais, a câmara federal, o senado e até a presidência da República.
Entretanto, guardadas as clássicas exceções da regra, políticos jovens não têm dado também bom exemplo quando estão no poder.
A verdade é que no país estamos órfãos de bons e competentes políticos que possam restaurar o ethos do passado.
Reconheço que o mundo de hoje é outro e muito mais complexo em todas as esferas da atividade humana. Contudo, há ainda amplo espaço a ser preenchido por vocações genuínas de políticos que façam de suas funções uma meio para aperfeiçoar a sociedade brasileira. Não é uma fantasia ou utopia minha. Indivíduos há talhados para assumirem mandatos políticos que tenham como pressuposto fundamental realizar mudanças profundas e duradouras na vida política da Nação. O que lhes falta é disposição e ânimo para saírem de seus casulos, de sua subjetividade sadia, de sua comodidade e tentar sem medo a carreira política e dela fazer um objetivo de vida: o bem público, o bem do país, a felicidade de um povo.
Temos, sem dúvida, grandes “reservas morais,” como eram chamados outrora os homens íntegros, que tanto poderiam fazer em prol de um Brasil melhor e mais transparente e tão distantes ficariam dos mascarados democratas do presente.
Enquanto houver, na arena política, esse excesso de partidos que só confundem mais ainda as camadas ignorantes de nossa população, o país só estará marcando passo, i.e., não sairá do imbróglio no qual está afundado e emaranhado.
As correntes político-ideológicas principais, a da esquerda e a da direita, agora se misturaram às escâncaras, sem cerimônia –às chamadas composições, alianças, coligações, concessões mútuas, num vale-tudo que qualquer brasileiro medianamente instruído está cansado de saber e de saber a que lugar geralmente chegam. O eleitor já não sabe o que seja esse melting pot incolor e polifônico.
Na realidade, as plataformas políticas, os programas partidários, as metas que deverão ser implementadas não passam em geral de retórica vazia e malsã para engodo dos humilhados e incautos, assim como – e por que não? – dos analfabetos funcionais, semi-analfabetos e analfabetos absolutos, massas de manobras que há décadas vêm sendo currais eleitorais que docilmente são iscas da mídia comprometida com o poder, aliada à fanfarronice dos meios eletrônicos, do marketing político, da execrável e inócua “propaganda obrigatória”, ainda com ranços ditatoriais, verdadeira pantomima que aos eleitores- telespectadores empurram goela abaixo. Esse lado trágico-histriônico da nossa vida política é, sim, um prato cheio para os estudos de análise do discurso dos linguistas e hermeneutas.
A grande questão que se levanta é a seguinte: por que atualmente não surgiram vereadores, parlamentares e congressistas do porte de antigos e respeitados políticos brasileiros? Em épocas passadas, antes da sede do governo federal em Brasília, não havia as chamadas mordomias – verdadeira orgia pantaguélica custando os olhos da cara dos milhões de contribuintes. Quem lê os artigos do Villas- Bôa Corrêa sabe de quê e de quem estou falando.
A função política do passado era investida de alguns valores caros ao ser humano: capacidade intelectual, poder de oratória e dignidade pessoal. Mordomias? Nenhuma. Salários Só os compatíveis com o mandato.
O tema deste artigo, aqui apenas aflorado, constitui farta matéria para pesquisas nas áreas da Ciência Política, da Sociologia, do Direito, da Antropologia e sobretudo para uma urgente discussão, por parte da sociedade brasileira, da natureza da práxis da vida política na atualidade.
Diante do quadro escorregadio que agora está se delineando como os primeiros passos que antecedem o período legal da corrida aos novos mandatos, não deixo de me preocupar com a gangorra que se esta montando tal qual um pacto fáustico, onde pouco espaço existe para a contribuição inestimável do Bem contra o espaçoso Mal.

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